sábado, 19 de julho de 2008

Coração de espuma


Tenho cara de quem brinca com sabão? Definitivamente, para cobrir o ócio de certas coisas, tenho brincado. Muita água e bolhas no espelho, deixando o espelho assim, num momento onde não pode refletir muita coisa. Esfrega, limpa, enxágua, enxuga. Nada muito diferente da rotina de se lavar. Os fones no ouvido servem de distração enquanto aquele local se higieniza. Na testa um suor de esperança. Na mente, um toque de dedicação mesclado com euforia. As mãos lisas e brancas pareciam não ter afinidade nenhuma com a vassoura. Os pés eram os que mais se divertiam no meio disso tudo, pois pareciam estar livres e vivos, escorregando para onde queriam. Hora do enxágue!
Vaso sanitário, armário, paredes, box. Todos recebendo fortes pancadas de água. O chão brilhava como os olhos de quem os via. De repente, a torneira usada para tirar o sabão daquilo tudo entope. Pausa para reformas técnicas. Acidente de percurso. O "fabricante de sabão" precisava parar seu serviço para os reparos. À sua frente uma espelho. Ensaboado por sinal. O garoto era diferente de qualquer um outro, pois conseguia ver além de um espelho que mal refletia. Um espelho ensaboado, que graça tem? Ninguém sabia é que o espelho ensaboado só refletia aquilo que você queria ver. Na brincadeira, e esperando o bom senso da torneira, uns minutinhos brincando no espelho ensaboado. O garoto desenhava o que ele queria e como queria. Flores, caretas e por fim, um coração. Por que um coração?
Algo simbólico, uma atitude bem pensada para demonstrar o amor que ele sentia. Aquele sentimento que alavancava as suas manhãs e que fechava suas noites com felicidade. Insônia, várias vezes levantando de madrugada. Era amor. O que o mundo precisava tanto, o garoto tinha em abundância.
Alguém capaz de fazê-lo crescer pessoalmente e intelectualmente e que dava impulso para começar um novo dia, ao seu lado. O coração simbolizava o amor que ele tinha pelas coisas simples, que se misturavam em medos e ansiedades. Simbolizava ainda o desejo, ainda que às vezes fraternal, que tomava conta da carne do corpo e de estar mais perto de quem o fez desenhar.
Nada de corações vazios, ele devia ser preenchido, ainda que com espumas, afinal, era simbólico.
Um coração que não dizia muita coisa, para quem não ia entender nunca. Um símbolo que faz parte da vida de alguém por alguns meses e que ainda faça por muito mais!
O fim do conto, seria a pia desintupindo e o coração sendo desmanchado. Errado. O fim do conto ninguém pode escrever ou adivinhar, pois ele não tem fim. Pode ser que a água tenha voltado, porém, não apagaria aquele coração fácil. Aquele coração que ainda estava cheio e que poderia passar o resto da sua vida assim, dando-a condução e o sentido preciso...

"All that I am hanging on, all of my world resting on your love."